quarta-feira, 14 de novembro de 2007

CAPÍTULO IV

CAPÍTULO IV

Após as brigas, já relatadas no capítulo II, em torno do título da antologia “10 Poetas em Busca de Um Leitor”, editada pelo Colégio Brasileiro de Poetas, resolvemos lançar o livro em tarde de autógrafos e, para tanto, após muitas escolhas, preferimos convidar o poeta Gióia Júnior, na época deputado federal, para paraninfo do grupo. Na tarde de autógrafos, além de Gióia Júnior, compareceram o prefeito na ocasião, Sr. Dorival Resende da Silva, o secretário de Cultura, alguns professores e outras pessoas importantes da cidade. Vender o livro, o que mais nos interessava, nada. Não conseguimos vender uma dúzia de exemplares. O que apuramos com a venda não cobriu os gastos que tivemos com o pequeno coquetel servido. Um verdadeiro fracasso. Ainda bem que as gazetas nos foram pródigas e deram verdadeiro destaque ao assunto. Um jornal de São Carlos, em dois artigos de página inteira, falou dos ideais do grupo, do seu pioneirismo e terminou publicando, com rasgados elogios, uma poesia de cada figurante da antologia, coisa para matar de inveja muitos políticos da cidade, que só viam seus nomes na imprensa, quando essa dava destaques aos escândalos e falcatruas em torno deles.
Nessa ocasião, a Secretaria de Cultura de Mauá, tendo à frente o professor Valdemir Barbosa, aproveitando a efervescência cultural da cidade, criou os famosos EPOMs – “Encontro de Poesia em Mauá” - título muito criticado por nós (que achávamos que deveria ser “Encontro de Poetas em Mauá”), em que foram premiados muitos integrantes do grupo, tais como: Castelo Hanssen (2 vezes), Moysés Amaro Dalva, Marco Salles, Iracema M. Régis (conto) e eu. Alguns poemas e contos vencedores nos concursos foram publicados em antologias pela Secretaria da Educação e Cultura e se intitularam: “
Encontro de Poesia, 1976, “Encontro de Contos, 1976, ambos organizados por Moysés e por mim.
Nesses encontros, conhecemos vários poetas, que, no futuro, viriam a integrar o Colégio, a exemplo: Antenor Ferreira Lima, Iracema M. Régis e outros. A Iracema aparecera em nossa frente declamando um poema borbulhante de ironia, em que satirizava os poderosos, que criavam, a fim de tampar os olhos do povo, slogans de um otimismo furado, idiota, em torno do “Milagre Brasileiro”. O Poema “
Este é um País que vai pra Frente” começava assim: “Este é um país que vai pra frente / Expressão quente / Está na boca da gente, / O slogan não mente ?” – O trabalho finalista fora defendido pela autora, na época ainda uma meninota, muito bonita, com forte sotaque nordestino, que declamava muito bem e, ao subir no palco, fora vivamente ovacionada pelo auditório, de pé, que logo entendeu o alcance de sua mensagem de protesto e deixou a nós, homens do grupo, logo de cara, todos apaixonados. Nessa noite, um dos meus trabalhos, intitulado “Negro Velho”, se classificou em segundo lugar e foi interpretado por Hélio Criolo, membro do Grupo de Teatro de Mauá – TECO, e também um exímio declamador.
Após recebermos os prêmios, fomos para a rua discutir a validade dos mesmos, chamando alguns dos jurados de burros, analfabetos, jejunos em literatura e coisa e tal (sempre, por esse ângulo, Moysés e eu éramos os mais exaltados). Tentei por várias vezes, nessa noite, puxar conversa, fazer amizade com a Iracema, tudo em vão pois a danada, não sei por que, não quis papo comigo e sim, com meus amigos, Hélio Criolo, Marco Salles e Samuel Fernandes. O tempo passou e, depois de alguns meses, reencontro-a no Correio. Nesse dia, conversamos muito; convidei-a a ingressar no Colégio Brasileiro de Poetas, do qual mais tarde foi presidente e daí por diante permanecemos sempre juntos, até os dias de hoje; ora publicando artigos na imprensa, a quatro mãos, ora editando livros juntos, visitando galerias, bienais, discutindo livros lidos, arte culinária (nosso fraco), visitando restaurantes, etc., sendo que Iracema, ultimamente, tem sido o papo literário mais constante de minha vida.
Como já foi dito no decorrer destas memórias, Moysés e Castelo Hanssen nunca se deram bem. A inimizade é tão velha e tão sem pé nem cabeça que nem eu, que sempre fui amigo dos dois, sei como começou. Os dois são paulistas, ambos brancos, ambos têm mais ou menos a mesma idade, ambos abraçaram, durante um certo tempo, idéias esquerdizantes, são homens sensatos e bons poetas. Até suas poesias se assemelham, falam do mesmo denominador, diferenciando-se apenas no tocante à forma. A poesia de Moysés é trovejante, arrebatada, desse tipo que arrepia a epiderme do leitor, enquanto a poesia do Castelo é dócil, mansa, acariciante, como “As águas dos correguinhos”. “Eu só queria ter palavras mansas,/eu só queria ter um verso amigo,/eu só queria ter um verso livre,/que o povo ouvisse pra cantar comigo” – do poema “
Eu só queria um pouco de Ternura”, do livro “Canção pro Sol Voltar”, Edições Mariposa, 1983. Moysés possuía muito daquele ímpeto de consertador do mundo, aprendido com Castro Alves e Victor Hugo. Vejamos: “É mister que se coloque/Um balde de lixo ali,/Não importa o preconceito/E os conceitos daqui,/Não importa o ambiente,/Que é falso embora decente.../Eu quero um balde de lixo/Depositado no canto ali!...”, “10 Poetas em Busca de Um Leitor”. Como podemos ver, um poema duro, arrogante; em que o poeta impõe as suas idéias a ferro e a fogo. Já Castelo Hanssen é uma espécie de Casimiro de Abreu alemão, com tendências políticas e sem a melancolia do autor de “Meus Oito Anos”. O grupo fora dividido em duas alas distintas: os simpatizantes de Castelo Hanssen e os de Moysés Amaro Dalva. Eu sempre fui mais ligado ao segundo, sem me imiscuir nas picuinhas dos dois. O Moysés é um homem cultíssimo, chegando às raias da genialidade, enquanto Castelo, apesar de ser um excelente cronista e poeta, é um homem comum, chão, como a maioria dos mortais. Moysés não; é um sujeito irrequieto, temperamental ao extremo, instável e, às vezes, de difícil acesso. Por andarmos sempre juntos e , na maioria das vezes, pensarmos parecido (embora com liberdade de pensamento), fui apelidado pelos partidários do Castelo de “Lugar-Tenente do Moysés”, o que não passava de pura infâmia, pois sempre tive idéias independentes e, por mais de uma vez, insurgi-me contra ele, que tinha idéias, a meu ver, suicidas, em relação ao grupo, uma das coisas que eu mais prezava na época.




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