Aristides Castelo Hanssen
Castelo, na segunda edição do seu “Canção Pro Sol Voltar” edição da Editora do Escritor, São Paulo, 2000, com capa de Rogério Aguiar Hanssen e Oswaldo Ferreira Alves, escreveu o que segue, numa nota intitulada:
Explicação do Autor
O saudoso professor Edinaldo Couto, introvertido poeta, fundador do Letraviva, de Guarulhos, fez as “orelhas”, gastando elogios desmerecidos, como compete ao grande amigo que ele foi. O extrovertido poeta, comentarista e crítico literário Aristides Theodoro, do Colégio Brasileiro de Poetas, de Mauá, fez o prefácio. Comunistas convictos que éramos, ele carregou nas tintas, pintando-me como um verdadeiro herói e mártir da democracia, e esse exagero também se deve ao grau de amizade que nos une até hoje. Mas foi a capa, feita pelo saudoso poeta Antenor Ferreira Lima, que me animou a publicar o livrinho. Concebida para quatro cores, acabou sendo impressa em uma só, por medida de economia.
Muita coisa mudou de
Algumas das poesias ainda são válidas, tanto que eu costumo recitá-las em nosso meio. “José”, em especial, é bastante solicitada, embora eu, hoje, não pense como pensava na época. Por isso, fiz “José de Hoje”, único trabalho inédito incluído nesta edição. Costumo declamar com freqüência poemas como “Atrás Daquele Horizonte”, “Sem Documento”, “Lágrimas”, “Segunda-Feira” e “Utopia”, que originalmente se chamava “Aquela Estrela é Minha”.
De 1983 para cá, escrevi muitas outras coisas, em prosa e verso, mais bem humoradas e otimistas, que dariam alguns livros. Se os anjos dissessem: “Amém”, me dando saúde e dinheiro, talvez ainda os publicasse algum dia.
O Autor
No prefácio do seu segundo livro, “Passárgada, Shangrilá e Adjacências”, o Castelo escreveu o texto que segue à guisa de prefácio:
O Manuel Bandeira me convidou para ir à Passárgada, mas eu não vou, não. Ele está certo, é amigo do rei de lá, e tem a mulher que quer, na cama que escolher. Mas eu não sou amigo de rei nenhum, e certamente não desfrutarei dessas mordomias. Periga até eu acabar trabalhando num jornal de Oposição, e ter que denunciar esse clientelismo, esse tráfico de influência, essa exploração da mulher. E aí suja para o poeta.
Não que eu seja melhor que os outros, incorruptível, puro. Nem que eu seja o eterno rebelde, o antitudo. Nada disso. É que não tenho sorte para essas coisas, e os reis não costumam ser meus amigos. Quando eles distribuem sopa, todo mundo está de colher, eu estou de garfo. A culpa não é deles, eu é que sou azarado nessas coisas. Pode até acontecer, na melhor das hipóteses, que o tal rei venha a gostar de minhas escrivinhações, e me chame para ser seu escriba. Mas de nada adiantará. Terei que botar terno e gravata (*), marcar cartão, e passar oito horas por dia escrevendo a favor do rei e de seu séqüito de puxa-sacos. E tudo para ganhar uma mixaria. Sei como são essas coisas; já trabalhei na Câmara Municipal. Trabalhar para rei, ou coisa que o valha, significa das duas uma: ganhar pouco, submeter-se a uma série de regulamentos: ou não ter que fazer nada, nem obedecer à regra nenhuma, e ganhar quanto quer, além de horas extras. E eu me conheço, sei que sempre acabo jogando no time dos trouxas. Não, Mané, me desculpe, mas eu não sei ser amigo do rei. Não vou-me embora pra Passárgada.
Fragmentos do poema José de Hoje de Castelo Hanssen:
vamos voltar aos tempos de esperança.
Que pena, José, que você cresceu
Eu virei criança.”
Duas Palavras em Torno de Maré Vermelha
Os versos de Antenor, como os da maioria que se lançam no difícil campo das letras, de certa forma não são perfeitos, ainda vão eivados de cochilões tão comuns nos iniciantes. Porém, alguns deles, cheios de calor humano, que merecem ser lidos com atenção. Antenor, em alguns poemas, como no caso de Desengano, coloca-se na pele do operário e põe-se a clamar contra as injustiças sociais, que solapam o país, atingindo momentos deveras culminantes. Vejamos:
“Entra ano e sai ano
E o mesmo desengano
Neste trabalho insano
Que não dá nem pra comer.
Sou explorado e mal remunerado
Trabalhando como um louco
Para o progresso do patrão
Que vive contente
À custa da minha miséria”.
Outro poema, que desperta atenção do leitor, é Justiça Sangrenta, onde o poeta alagoano, a exemplo de Hemingway, de “A Morte na Tarde” e “O Sol Também se Levanta”, após se informar sobre as Plazas de Toros espanholas, recria através de seus versos, todo um ritual taurino, cheio de emoções e verve, criticando assim a “audácia”do toureiro, que como um “centauro bronco”, como diria Euclides da Cunha, persegue um animal humilhado e indefeso, isso para alegria da “multidão sedenta que grita: olé!...”
Vende-se é outro poema que merece destaque, devido a sua boa fabulação; poema esse, que vem carregado de ironia, uma ironia mordente, quando o poeta diz o seguinte:
“Vendem-se dois peitos másculos / Que não
(servem para adornar
......................................./.............................
Os órgãos sexuais bem conservados / Que
(Servirão para transplante
Ou reimplante em um atrofiado / Vende-se
(tudo baratinho
Por motivo de desemprego.”
Antenor Ferreira Lima oferece-nos, nesse seu “Maré Vermelha”, a sua visão do mundo; tudo interpretado a seu modo, dentro do seu enfoque pessoal de ver e entender as coisas e os homens do seu tempo.
“Maré Vermelha”, como já foi dito, é um livro de iniciante, que já deixa transparecer, muito bem, o surgimento de um poeta, que com o tempo, aprenderá os macetes da arte de escrever e poderá ainda nos dar coisas preciosíssimas no campo das letras. Antenor, por este lado, é um poeta que promete, pois é um incansável trabalhador, que vive sempre a ruminar um novo poema,portanto um poeta de quem muito devemos esperar.
Aristides Theodoro
Mauá, 23 de agosto de 1978
Leitor Amigo
"Nascemos do povo e cantamos para o povo”.
Poetas hodiernos, seguimos o padrão atual da poética livre e o nosso trabalho não se guardou do bafo, não se distanciou do povo, não se fechou em torre de marfim, não se omitiu da Verdade, nem tratou de temas ligados à falsa poética romântica.
Talvez seja esta coletânea um cântaro de cânticos amargos pois que, se reporta à realidade do homem da rua, onde os rigores da vida não deixam margem a ilusões fúteis. Mas esta coletânea cumprirá seus objetivos porque se mantém tematicamente ao nível de “povo-povo” e nossa razão poética emanou da rua, do frio, do sofrimento, mas emanou também da bondade e do amor universal que ainda vive dentro de quem tem fé (e ainda são muitos os que a têm).
Do valor real desta, afirmará o leitor querido, a quem buscamos como razão única de nosso trabalho. A sua decisão de validade será nosso ponto cardeal nesta busca incessante da Verdade – Escreva-nos.
Moysés Amaro Dalva
Surge na Poesia de Castelo a Esperança do Povo
É difícil de se acreditar que um homem de cabeça-no-vento,
Cara-de-mamão-macho e barriga-de-cumbá, possa produzir versos tão belos como os inseridos neste livro.
Castelo vem provar, por a mais b, que o homem não se valoriza pela aparência física, nem pelo traje que envolve seu corpo, nem pelas alparcas que protegem seus pés, nem pela situação financeira em que se encontra, nem pela cor da pele que tanto incomoda aos racistas da vida, e, nem pela religião que professa. O homem se valoriza pelo caráter que possui.
Conheci-o há uns dez anos, quando resolvemos articular definitivamente o Colégio Brasileiro de Poetas. Foi por ocasião do recebimento do troféu em que fez jus ao primeiro prêmio, num dos EPOMs de Mauá, sendo um dos poetas mais premiados de nossos dias. O segredo de todo sucesso provém da simplicidade da forma de como escreve e do ritmo do seu trabalho, com perfeita desinência nas rimas. Só que o bicho é teimoso como uma mula, não admitindo interpelação, sem arredar o pé, diante de uma frase estrambótica, a exemplo de Monteiro Lobato, que foi um ranzinza contra a gramática. Castelo não poderia ser diferente, cometendo aberrações (propositalmente*): “Mais maior que o mar”, “Vamos juntar nós dois nossos fracassos”e assim por diante.
Sua poesia é de cunho extremamente social tão bem bolada, que chega a passar por lírica. Castelo é um homem sério e batalhador, mas como todos, também tem o lado humorístico. Conhecemos o outro lado: Reuniram-se num bate papo em torno de literatura em minha casa, os seguintes companheiros: Moacir Alves da Silva, Samuel Fernandes de Aguiar, Iracema Mendes Régis, Aristides Theodoro, Dirceu Hanssen, Alice Sestavo Lima e eu, sentados em volta de bandejas de petiscos, refrigerantes, cervejas, batidas e pingas, palestrávamos animadamente, quando o Castelo, tossindo mais que um cachorro magro, armado de um copo de cerveja, uma bandeja de petiscos, um cigarro fedorento, papel e caneta, punha-se à entrada, fazendo tudo ao mesmo tempo e ainda escrevendo alguma coisa, desligado totalmente.
Após alguns instantes, relaxadão como ele só, com ar de ingenuidade, anuncia a besteira que havia escrito: “A Poesia do Homem Cagando”, discorrendo da seguinte forma para espanto de todos:
“Um homem é um homem
mesmo humilhado,
mesmo castrado,
mesmo cagando,
Um homem é um homem,
Um soldado é um soldado”. (**)
Não faz muito tempo, quando assumiu uma vaga na Academia Guarulhense de Letras, ele se dirigia ao recinto de chinelos e mangas de camisa, suado e fedendo como macaco; ao ser surpreendido por um daqueles que o obrigou a tomar banho e usar terno, gravata e calçados emprestados, como se Castelo ligasse para isso: “Querem que eu seja um homem de gravata / um cidadão, senhor e coisa e tal.. Mas eu quero ser eu / uma pessoa / um ser vivente, uma vidinha à-toa / ter sangue e coração, ser animal. / Eu quero ser um poeta / no tempo em que a poesia é marginal”.
Apesar da humilhação passada, prisão e etc., Castelo nunca deixou de acreditar no ser humano e em dias melhores. O que é uma missão de poeta, que não se cala diante das injustiças sociais e do desconcerto do sistema político e da incompetência dos mandatários, originadores de toda confusão entre o povo desesperado, caracterizando sua revolta: “Pobres idiotas!... / se enganam pensando que enganam o mundo, / que o medo dos mansos os levam à vitória. / Queimando as palavras se esquecem de ler, / se esquecem de ver o exemplo da História”. Apesar dos desajustes, opressões, anseios, surge na sua poesia a esperança do povo: “Esperança que um dia esse povo / contente de novo / cantando na rua que então será sua / tenha outros motivos para festejar”.
Diante de palavras tão belas, a gente que é aprendiz de feiticeiro, tem de se dobrar e reverenciar.
Antenor Ferreira Lima
(*) Castelo sempre foi um relaxadão, nunca ligou a mínima para a gramática, às vezes atropelava-a, unicamente por prazer e nunca por desconhecer as regras do bem escrever. Vindo daí os prováveis “erros”, citados pelo Antenor. (NDA).
(**) A Poesia do Homem Cagando não foi escrita na casa do Antenor e sim, numa mesa no antigo Bar do Yugo, lá pelos anos setenta e tantos, no centro de Mauá. (NDA).
O Sol Está Voltando
Ernesto dos Santos Milagre, escrevendo as “orelhas” da segunda edição de “Canção Pro Sol Voltar” de Castelo Hanssen, disse o seguinte:
Canção Pro Sol Voltar, é a vida do poeta Castelo Hanssen em prosa e versos, que se mistura com a nossa vida de sonhos, desejos, medos, tristezas, solidão e esperança.
Quem não se lembra de poesias como, Atrás Daquele Horizonte, em que o poeta nos apresenta um mundo imaginário em que gostaria que vivêssemos, onde o amor e a paz sempre vencem. José, na verdade, é um menino que Castelo conheceu em uma gráfica e imortalizou em uma poesia. É Noite e os Gatos são Pardos fala de um momento triste da história do país e de Castelo. Época de ditadura e de barbárie, em que o nosso poeta passou pela prova de fogo e ficou provado que era ouro, não derreteu.
Este é um livro que, se tivesse inspiração e fosse poeta, gostaria de escrever, mas me sinto feliz por ter conhecido de perto esta obra e dela ter tirado lições de vida e muitas vezes lançado mão de suas poesias, para a defesa de injustiçados no meu trabalho de advogado.
Os poetas, para mim, são seres iluminados, profetas que anunciam o futuro, ao mesmo tempo em que nos despertam para a nossa irracionalidade e suas conseqüências.
Para falar sobre Castelo Hanssen seria necessário um novo livro e com certeza a tarefa não seria levada a termo. O Castelo não comporta explicações, interpretações, comparações. Ele existe para ser sentido, amado, respeitado e preservado para sempre, como patrimônio da humanidade. Castelo, o sol está voltando, e isso só pode ser visto pelos que enxergam com os olhos da alma, como você.
Ernesto dos Santos Milagre
Este é o prefácio que o advogado Valdir Carleto fez para a segunda edição de “Canção para o Sol Voltar”, de Castelo Hanssen.
Já tive muitos privilégios na vida. Um deles é o de ter conhecido Castelo Hanssen, trabalhar com ele, aprender tanto com ele, aprender a admirá-lo e, agora, o imenso privilégio de escrever o prefácio da nova edição de seu “Canção Pro Sol Voltar”.
“É uma tarefa das mais agradáveis e, ao mesmo tempo, das mais difíceis. Temo ser repetitivo e passional, já que o Castelinho para mim é mais do que um amigo; é a demonstração inequívoca de que somos todos irmãos. Temo não encontrar as palavras certas para falar de seu livro, de sua obra poética, porque confesso nada entender de poesia, apenas sinto se gosto e não gosto, se me toca, se me diz alguma coisa.
A Poesia de Castelo Hanssen é um misto de agreste e doce, é uma lâmina que fere, e uma mão que acaricia. É esse grito de dor e esse sussurro do amanhecer. É de uma alegria contagiante e de uma realidade entristecedora.
Toda a obra do Castelo é a síntese dele mesmo. É esse ser contrastante, mais do que sequer se dá algum valor, é esse homem culto, inteligente e altivo, que defende com unhas e dentes os valores nos quais acredita.
Castelo é o avesso do ser humano contemporâneo. Sua poesia é o avesso de todos os estilos. Castelo é o ser humano de maior bondade que já conheci. Sua obra contém poemas, os mais marcantes que já li. Que me perdoem todos os outros seres humanos, que me perdoem todos os demais poetas, aos quais também aprecio e respeito.
Quis a natureza que os olhos de Castelo impedissem que ele continuasse sua luta diária no Olho Vivo. Mas nada o tem impedido de manter sua chama em defesa da liberdade, do amor e da verdade. Todos torcemos para que seus olhos voltem a lhe dar o prazer de ver nitidamente o Sol Voltar a cada dia.
Sei lá se o que acabo de escrever se parece com prefácio de um livro de poemas. Mas tenho certeza de que o Castelo não está muito preocupado com isso. Escrevi com o sentimento, com o apreço que tenho por esse cidadão da melhor qualidade, a quem todos nós, talvez, não tenhamos ainda reconhecido como ele merece.
Tenho certeza de que o Castelo não está preocupado com o que não seja a sua Poesia, único bem que ele se preocupou em ter para si, para poder reparti-la com todos, ontem, hoje e sempre. A Poesia é como o amor: quanto mais se divide, mais se multiplica. E isso é que faz do Castelo e de sua obra um exemplo.
Valdir Carletto
O Poeta Edinaldo Couto escrevendo as orelhas da primeira edição de “Canção Pro Sol Voltar”, de Castelo Hanssen, Edições Mariposa, 1983, disse assim:
O que sói acontecer, em casos semelhantes é depararmo-nos com uma heterogeneidade qualitativa, de modo a divisarmos uma obra mista e híbrida composta de bons poemas, poemas fracos, outros razoáveis, alguns muito bons, outros ótimos. Incomum é ocorrer, numa obra literária, uma concentração hegemônica de somente bons trabalhos.
No entanto, em “Canção Pro Sol Voltar”, coletânea poética de Castelo Hanssen, dá-se o contrário: uma sucessão de poemas do mais alto nível e da mais alta qualidade, como num crescendo, impedindo o leitor de parar sua leitura; ao contrário, induzindo-o a prosseguir e conhecer sem delonga toda a obra. Fato que dificulta ao leitor escolher o melhor trabalho. Quando muito, destacará o que menos gostou, que nem por isso é inferior aos demais.
Aristides Castelo Hanssen, jornalista militante de nomeada, atuante em jornais da Capital, da Grande São Paulo e do interior do Estado, é, também, ou antes de tudo excelente poeta, contista e cronista, com trabalhos publicados em vários jornais e revistas brasileiros, bem como em várias antologias do gênero.
Reside em Guarulhos, o poeta, em apreço; exerce influência marcante entre os intelectuais da cidade e com garra, guerra, inteligência, sensatez, competência e gabarito exerce o jornalismo em várias empresas jornalísticas de nosso município.
Poeta laureado, detentor de vários prêmios literários, Castelo Hanssen é membro efetivo da academia Guarulhense de Letras (que ajudou a fundar); foi o principal fundador do Movimento Literário Letraviva, tendo sido seu primeiro presidente. Atualmente, com larga influência no grupo literário mencionado, ocupa a secretaria geral do órgão. Integra, outrossim, o Colégio Brasileiro de Poetas, de Mauá, como membro fundador, onde exerce similar influência cultural e artístico-literária, junto àquela instituição.
Poeta seriamente comprometido com o mundo contemporâneo, com a sociedade em que vive no seu tempo, consciente de seu papel de intelectual de ação e de agente modificador de desenvolvimento e de mudanças sociais, a poesia de Castelo Hanssen é na essência modernista, às vezes, moderníssima, jamais “modernosa”, felizmente, entretanto conservando sempre a essência poética e a feição estilística da verdadeira e eterna poesia.
Impregnada de lirismo, com forte e visíveis conotações sociais, a poesia castelina constitui um grito de liberdade – e mais que isto – um grito de libertação. Se não, vejamo-la através de um fragmento de “Canção Pro Sol Voltar” – poesia-tema da presente obra:
“Os donos do mundo com suas mil bocas / que falam de guerra, de “marcha-soldado” / disseram ao povo: ser bom é fraqueza / sorrir é tolice, amar é pecado”.
Que fique o leitor, e prossiga na agradável companhia poética de nosso Castelo Hanssen.
Queríamos um mundo melhor, onde homens de todas as classes pudessem revelar os seus mais íntimos pensamentos, sem serem molestados pelos morcegos, chacais, hienas e aves de rapina, que saíam na escuridão da noite, procurando a quem pudesse tragar.
Os poemas de Castelo Hanssen são, de certa forma, uma radiografia desses tempos sem luz, por que passou o povo brasileiro. Leiamos, a título de exemplificação, trechos do poema “É Noite, Os Gatos são Pardos”:
“a gente nunca distingue
qual é o amigo sincero,
qual é o amor verdadeiro
e qual a flor cujo cheiro
não é tóxica ou mortal...”
Em outra estrofe do mesmo trabalho, o poeta diz, como a alertar outros viventes, que como ele, poderiam cair a qualquer momento, nas garras dos vampiros sedentos de sangue humano, os quais, a exemplo da PIDE salazarista ou dos agentes sanguinários da KGB russa, seguiam os transeuntes como sombras invisíveis:
“Os muros todos escondem:
ladrões e policiais,
as amizades escondem
os dedo-duros fatais.
.................................
.................................
É noite, tudo é mentira...”
Castelo Hanssen, um homem superior, mesmo após ter apodrecido na cadeia e perdido um irmão (Olavo Hanssen), não se curvou diante dos arbítrios, nem se tornou um homem amargo, lamuriento, desses que pretendem fazer justiça com as próprias mãos. Pelo contrário, numa atitude de “eles não sabem o que fazem”, Castelo Hanssen passou a viver a sua vidinha rotineira e a derramar o excesso da ternura que enche o seu coração, através dos seus versos límpidos, serenos, desassombrados e cheios de esperanças, que aspiram por um mundo melhor, onde reine amor e fraternidade entre os homens:
“Um país onde as pessoas
não tenham vergonha de amar
..............................................
..............................................
..............................................
Um país onde o governo
não fabrique leis ou códigos
para poder governar.
O coração faz as leis
e a natureza é o estatuto
que ninguém pensa em burlar,
o governo nunca mente
porque o governo é a gente
e ninguém quer ser enganado.”
Como vemos, Castelo Hanssen é um poeta maior, um desses seres de rara sensibilidade, que sempre desejam o bem e a fraternidade entre os homens. Às vezes, mesmo àqueles que lhe fizeram o mal. Toda a sua poesia está saturada de altruísmo, ternura e compreensão. Castelo Hanssen, agora o homem, é um ser boníssimo, uma espécie de São Francisco de Assis; inimigo da violência, das palavras alteradas e da miséria, é um homem capaz de repartir com seu semelhante até o último níquel do bolso, ou a última côdea de pão, assim como nos ensinam os evangelhos. Trata-se de um homem que nunca se definiu por esta ou aquela religião formal; a sua religião é a do amor, da ternura, da compreensão entre os homens, atitude esta, que não se encontra facilmente em nossos dias.
A poesia de Castelo é uma poesia de teor nacionalista, não esse nacionalismo piegas, atabalhoado e lambuzado de verdeamarelismo, que anda por aí afora, na boca de incompetentes políticos demagogos e ufanistas comentaristas de futebol, que vivem a urrar loucamente, tentando convencer com sua verborragia bestializada as camadas menos esclarecidas.
Não, a poesia de Hanssen é de um nacionalismo sadio, universal, se é que assim posso dizer, que não se prende a fronteiras, credos, raças, ou cores. Trata-se do nacionalismo do amor, a exemplo do ensinado por um judeuzinho humilde, que há quase dois mil anos errou pelas terras da Palestina.
Espero que o leitor, ao adentrar este livro, beba, como eu, toda a fraternidade que jorra desta fonte de pereníssima cristalinidade.
A poesia de Castelo Hanssen, nem sempre, prima pelas palavras grandiloqüentes, retumbantes, de efeitos declamatórios. Trata-se de uma poesia humilde, tal qual a figura de seu autor; por não ser barulhenta, é transparente como as “águas dos correguinhos”, tão cantadas pelo trovador. Castelo, a meu ver, é a mais expressiva vocação poética da minha geração e estou certo de que seu nome figurará com destaque nas futuras páginas que retratarem a literatura que hoje se escreve no Brasil.
Castelo Hanssen é jornalista e ao nosso lado, com Mané Galileu, Dirceu Hanssen e Moysés Amaro Dalva, ajudou a criar em 1973 o Colégio Brasileiro de Poetas e mais tarde criou nos moldes deste, o Grupo Letraviva, de Guarulhos, que vem desenvolvendo um ótimo trabalho em prol das letras em nossa terra. Castelo é membro da Academia Guarulhense de Letras e participou de várias antologias, tais como: Encontros de Poesias (1976), publicada pela Prefeitura Municipal de Mauá; Antologia Poética do Colégio Brasileiro de Poetas – edição mimeografada – (1977); 10 Poetas em Busca de um Leitor (1977), Edições Mariposa; Amostragem Literária da Academia de Letras de Guarulhos (1980); Revoada de Pássaros Negros (1980), edição do Colégio Brasileiro de Poetas; Aleatória nº XII, Centro Acadêmico Armando Salles de Oliveira – CAASO – Campus de São Carlos (1981); Antologia Letraviva (1982) e Útero da América (1983), Edição do Colégio Brasileiro de Poetas.
Castelo é autor de Passárgada, Shangrillá e Adjacências, edição do Grupo Letraviva, contendo 10 poemas e um pequeno prefácio do autor, sem data. Também contribuiu com seis poemas na Revista da Academia Guarulhense de Letras nº 2, ano II, 2000, contendo alguns poemas novos. E publicou a segunda edição de Canção Pro Sol Voltar em 2000.
Aristides Theodoro em Prefácio à
Canção Pro Sol Voltar, 1983
Depois desta pequena digressão, vou falar de um poeta, que talvez, devido a seus pontos de vista e a seu modo de encarar as coisas e os homens do seu tempo, esteja mais perto da “criatura de Deus”, isso por ser um homem que capta as coisas mais simples deste mundo e transforma-as
Os mais contundentes versos de Antenor, a meu ver, são justamente os de cunho social, precisamente os da primeira parte do livro, onde o poeta inclui poemas como Vende-se, que nada mais é, que uma sátira mordente, que espinafra a ganância do homem moderno, esse apressado e preocupado das grandes cidades, que não tem tempo para viver; para ver as belezas da natureza, contemplar um pôr-de-sol, o desabrochar de uma rosa ou uma onda empolada que se arrebenta na praia. O homem, visto por Antenor, vende o seu próprio corpo, em pequenos fragmentos, num tremendo desespero; pois toda a sua atenção se concentra no “deus dinheiro”, o chamado “vil metal”, tão ambicionado. Já em “Moleque Travesso”, o trovador se volta para os problemas do menor abandonado, aquele que nasceu predestinado a ser bom, como todos os representantes da raça humana, mas que, levado por circunstâncias múltiplas e acossado pela fome, pela promiscuidade, pela falta de escola e de apoio dos poderosos deste mundo, se torna mau, violento, e em muitos casos, criminoso precocemente. Esse poema é, sem dúvida alguma, uma peça que faz pensar e que deixa o leitor a se interrogar: - será que eu também não tenho culpa pelas misérias do meu semelhante?... Devemos lembrar-nos que o velho Thomaz Merton, já dizia “que nenhum homem é uma ilha isolada”.
Já o poema intitulado “O Homem do Século XXI” possui um tom apocalíptico onde o poeta mauaense, com um pessimismo digno de George Orwelll, de “
Antenor Ferreira Lima, em muitos dos seus versos, zomba dos poderosos do dia, dos donos do mundo, da prepotência reinante no universo, enfim, de todas as mazelas que diminuem a condição humana. No poema intitulado, “Não Posso Rir”, por exemplo, temos um verdadeiro contraste entre a renda mal dividida, pregada de cátedra por alguns bem informados cientistas políticos. Nesse poema, o poeta, numa sábia comparação, apresenta de um lado a riqueza e o luxo das grandes cidades, em fragoroso contraste com a miséria, a fome e a sordidez dos tugúrios abjetos, que abrigam quantidades imensas de operários subalimentados e mal pagos. Esse mesmo operário sem amanhã e calado ainda não fora beneficiado pelo decantado “milagre brasileiro”, pregado pelos tecnocratas da revolução de 64.
“Maré Vermelha”, pelo tom contundente de alguns de seus poemas, é obra que deve ser lida e examinada por todos, em especial, por todo mauaense, pois se trata de um poeta de nossa cidade.
A Voz de Mauá 23/11/78
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